Eram passos lentos os que trazia.
Lançava-os no chão. Naquele que sabia e no outro que nunca pisara mas onde cresciam as papoilas que um dia haveria de colher. Um dia, um qualquer dia de um qualquer tempo , numa qualquer dimensão.
Eram passos seguros, firmes, mas propositadamente lentos. Neles, ouvia a história das pedras, respirava o aroma cicatrizante do pó da terra e, enquanto guardava nos bolsos o orvalho da noite suspenso nas ervas daninhas , subia-lhe aos lábios o sabor vertical do trigo a oferecer-se-lhe à fermentação da vida.
Do caminho, não lhe importava o rasto, apenas o peso de si própria moldado no barro, qual ânfora a saciar a fome de humanidade. Talvez por isso levasse consigo, pousadas nos ombros, todas as lágrimas que lhe confiavam e mais umas quantas rugas, suas e de outros, porque o saber do tempo era o único tesouro que conhecia.
Um dia, desejou que tudo de si fosse fértil como água nascente, mas nem por isso apressou ou refreou a passada. Se o sol lhe era força a aquecer a alma, respirava mais fundo para a guardar no coração e aí se abrigar das imperfeições do vento norte. Mas quando era chuva o que chegava do céu, erguia o rosto e recebia nele cada gota, como quem bebe um oásis, sabendo que os desertos existem e aí, nem as pedras desejam falar da sua própria história.
Saboreava cada milímetro da sua caminhada como se semeasse e colhesse estrelas e as amasse a todas de igual modo, como filhos diferentes mas de brilho igual.
De quando em vez, uma rodopiante aragem envolvia-lhe os sentidos e via-se então, de braços abertos, numa afinidade de asas com quem nasce a voar. Era assim que planava livre por dentro dos sonhos e descobria que essa era, de todas, a mais bela viagem.
Eram lentos os passos e grandes os sonhos.
Eram imensos os sabores, e isso já era tanto para se sentir feliz.